No Comboio

Um destes dias, no comboio sentei-me no lugar ao lado de um homem já com os seus setenta ou oitenta anos que olhava para um qualquer jornal nas suas mãos.

A minha aventura como utilizadora frequente dos transportes públicos tem pouco mais de um ano, mas entretanto já aprendi que a) a fila na paragem começa junto da placa com o nº do autocarro, b) há gente que leva muito a sério o seu lugar na fila e que é capaz de passar uma viagem inteira a discutir por isso, c) é díficil manter o equilíbrio no metro sem me baloiçar pelo ferro, d) há sempre alguém que faz uma avaliação não muito dissimulada do que estamos a vestir ou a calçar e finalmente, e) sempre que alguém abre um jornal, uma ou duas cabeças inclinam-se discretamente - ou nem tanto - para espreitar.

"Em Roma, sê romano", portanto, o meu olhar intercalava entre o mar no final de tarde e as notícias que o senhor ia virando com rapidez. Cansei-me de acompanhar o ritmo de leitura e pouco depois já só tinha olhos para o mar sereno, até notar que a minha companhia de viagem tinha parado de passar páginas. Espreitei de novo.  Colocara os óculos, olhava com atenção para a secção de obituário e lia em voz baixa os nomes, como se os procurasse na memória.

Voltei os olhos para a janela e pensei se um dia serei eu a ocupar aquele lugar e a percorrer com o dedo nomes na página de um jornal (será que ainda vão existir jornais em papel?), reconhecendo nomes de amigos que nunca mais vi. Será que me vou lembrar dos seus nomes? Será que vou sentir alguma coisa quando os souber idos, mais do que saudade de outros tempos? Será que ainda vou ver o mar da minha janela?

Entretanto já tinha escurecido lá fora, o jornal fora fechado e acabava de chegar ao meu destino.

Babs às 01:02
sinto-me: pensativa